quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Filosofia na Conservação Ambiental - Heidegger: “salvar é deixar-ser” por Nancy Mangabeira Unger

Heidegger:  “salvar é deixar-ser”
Nancy Mangabeira Unger

in http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/publicacao4.pdf
(pag 157 a 165)

Os mortais habitam à medida que salvam a terra, tomando-se a
palavra  salvar  em  seu  sentido  antigo,  ainda  usado  por  Lessing.
Salvar não diz apenas erradicar um perigo. Significa, na verda-de: deixar alguma coisa livre em seu próprio vigor. (...) Os mor-tais  habitam  à  medida  que  acolhem  o  céu  como  céu.  Habitam
quando permitem ao sol e à lua a sua peregrinação, às estrelas a
sua via, às estações dos anos a sua benção e seu rigor, sem fazer
da noite dia nem do dia uma agitação açulada. (“Construir, ha-bitar, pensar”, em Ensaios e conferências, p. 30.)
Opensador  alemão  Martin  Heidegger  ( 889- 976)  é  considerado  um
dos  maiores  filósofos  do  século  XX,  tendo  influenciado  de  manei-ra  determinante  pensadores  como  Foucault,  Lacan  e  Derrida,  entre
tantos outros.
Embora  nunca  tenha  falado  em  meio  ambiente  ou  ecologia,  seus  escritos
constituem  uma  referência  preciosa  para  aqueles  que  querem  pensar  a  questão
ambiental  a  partir  de  seus  fundamentos.  Para  isso,  é  necessário  compreender  a
dinâmica de uma civilização que reduziu todos os seres – e finalmente até o pró-prio ser humano – à condição de objetos para a afirmação do sujeito humano que,
tomado por uma busca insaciável de poder e controle, se erigiu não só em mestre
*  Filósofa, doutora em Filosofia da Educação, professora da Universidade Federal da Bahia.
e  senhor  da  natureza,  mas  em  centro  ontológico  do  real.  Heidegger  dirá  que  é
esta compreensão do Ser como objetividade que possibilitará que a racionalidade
tecnológica seja usada para oprimir a natureza e os outros homens. Uma vez que
o  ser  humano  esquece  que  sua  vocação  existencial  é  de  ser “a  casa  do  ser”,  ou  o
canal  através  do  qual  o  cosmos  pode  se  presentificar  de  novas  maneiras,  então  o
próprio  homem  pode  ser  visto  como  mero  objeto  cuja  exploração  se  justifica  na
busca de mais e mais poder.
A  gravidade  da  situação  que  hoje  atravessamos  começa  a  tornar  manifes-to,  para  um  número  crescente  de  pessoas,  que  a  crise  ambiental  é  o  sintoma,  a
expressão  de  uma  crise  que  é  cultural,  civilizacional  e  espiritual.  Uma  crise  que
nos  obriga  a  pensar  esta  questão  que  ficou  esquecida  por  tanto  tempo:  a  nossa
compreensão do Ser. O pensamento de Martin Heidegger questiona a base antro-pocêntrica e auto-referencial do humanismo moderno. Busca uma nova dimensão
do pensar que supere a racionalidade unidimensional hoje dominante, mostrando
que  a  noção  do  ser  humano  como  sujeito,  fundamento  de  toda  verdade,  valor  e
realidade, é historicamente datada e pode ser desconstruída. Heidegger rememora
a presença do Mistério da realidade que se manifesta em todo “é” de tudo que é,
pondo-se  à  escuta  do  sentido  essencial  da  época  da  técnica  na  qual  vivemos.  A
filosofia heideggeriana não constitui um sistema fechado: antes, indica um modo
de caminhar, no pensamento e na vida.
Para  aqueles  que  pensam  a  questão  ecológica  em  seus  aspectos  filosóficos  e
espirituais,  é  de  singular  importância  uma  ética  que  nos  permita  viver  harmonio-samente sobre a terra, e que se baseie no sentido de respeito e de cordialidade por
este  lugar  e  por  seus  habitantes.  O  sentido  originário  da  palavra  grega  ethos  é  de
morada, não no sentido de uma construção material com paredes e teto, mas como
a ambiência, o modo de ser em que o ser humano realiza sua humanidade.
No pensamento de Heidegger, todo morar autêntico está ligado a um pre-servar.  Preservar  não  é  apenas  não  causar  danos  a  alguma  coisa.  O  preservar  ge-nuíno tem uma dimensão positiva, ativa, e acontece quando deixamos algo na paz
de  sua  própria  natureza,  de  sua  força  originária.  Assim  também,  salvar  não  tem
unicamente  o  sentido  de  resgatar  uma  coisa  do  perigo:  salvar  é  restituir,  ou  dar
condições para que ela se revele naquilo que lhe é mais próprio. Salvar realmente
significa deixar-ser.
Se o morar genuíno deixa que cada ser desabroche na plenitude de sua essên-cia, a dominação está ligada a todo fazer, a todo pensar, nos quais o homem projete
sobre as coisas a sombra de sua própria vontade e as transforme em objetos de sua
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propriedade.  Esta  atitude,  que  está  a  um  passo  da  espoliação,  é  característica  da
concepção moderna do que seja conhecer. A imposição unilateral deste modo de se
relacionar com o real ofusca os seres e corresponde a um estreitamento da capaci-dade humana de experienciar a vida.
Esta determinação, talvez muito precisa, da pedra continua um número, mas
o  que  significa  verdadeiramente  para  nossa  experiência  o  peso  da  pedra  enquanto
fardo,  enquanto  gravidade,  escapou-nos.  Este  pensamento  se  revela  nas  seguintes
reflexões de Heidegger:
Nós  chamamos  este  chão  de  terra.  O  que  esta  palavra  diz  não
deve ser associada com uma massa de matéria depositada em al-gum lugar, ou com uma idéia meramente astronômica do planeta
[...]. Uma idéia meramente astronômica do planeta Terra e uma
idéia  da  terra  como  uma  massa  distribuída  em  algum  lugar  não
dizem o que a terra é. A terra é o lugar onde tudo que surge, tudo
que cresce, volta a encontrar abrigo (Heidegger, 97 , p. 42).
[...]
Uma  pedra  pressiona  para  baixo  e  manifesta  seu  peso.  Mas,
enquanto  esse  peso  exerce  sobre  nós  uma  pressão  de  oposição,
recusa-nos  qualquer  penetração  em  seu  interior.  Se  tentarmos
tal  penetração,  quebrando  a  pedra,  mesmo  assim  ela  não  nos
mostra,  em  seus  fragmentos,  qualquer  coisa  interior  que  tenha
sido  assim  descoberta.  A  pedra  instantaneamente  se  recolheu
novamente  para  dentro  da  mesma  opaca  pressão  e  volume  de
seus fragmentos. Se tentarmos agarrar o peso da pedra de outra
maneira,  colocando  a  pedra  numa  balança,  nós  meramente  a
traremos para a forma de um peso calculado (op. cit.,p.46-47).
Em outro momento inspirado, Heidegger afirma:
A cor brilha, e quer somente brilhar. Quando a analisamos em
termos racionais, medindo suas ondas, ela já se foi. Ela se mos-tra  somente  quando  se  manifesta  velada  e  inexplicada.  Assim,
a  terra  estilhaça  toda  tentativa  de  nela  penetrar.  Ela  faz  com
que  todo  agir  inoportuno  e  meramente  calculador  sobre  ela  se
torne uma destruição. Essa destruição pode se apresentar sob a
aparência  do  domínio  e  do  progresso,  na  forma  da  objetivação
técnico-científica da natureza, mas esse domínio permanece, en-tretanto, uma impotência da vontade (Heidegger, 97 , p. 47).
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O velado da terra, a pedrice da pedra, o brilho da cor não podem ser reduzi-dos  unicamente  ao  que  o  pensamento  do  cálculo  apreende,  porque  são  ontofanias,
modos de revelação do ser, que possibilitam múltiplos sentidos e remetem a diversos
níveis de experiência. Se a imposição unilateral deste modo de se relacionar com o
real  constitui  o  desenraizamento  próprio  do  homem  moderno,  o  morar  que  é  um
preservar  e  salvar,  isto  é,  que  deixa-ser,  propicia  ao  ser  humano  a  condição  de  um
novo enraizamento.
Os  “mortais”,  que  Heidegger  contrapõe  ao  homem  planetário,  são  aqueles
que  sabem  habitar,  morar,  no  sentido  pleno  da  palavra,  isto  é,  que  sabem  respeitar
a Terra e seus seres, acolher e preservar, deixar o próximo ser próximo e o distante
ser distante, reconhecer o sagrado, assumir a morte. São os seres humanos que são
capazes  de  acolher  a  morte  enquanto  morte,  isto  é,  de  percorrer  todas  as  transfor-mações e metamorfoses da vida.
Segundo Heidegger, a filosofia que fundamenta o desenvolvimento da tecno-logia moderna – a filosofia moderna – estabelece uma relação inteiramente nova do
homem com o mundo. O mundo doravante aparece como um objeto, e unicamente
como um objeto, a ser enquadrado e controlado. Esta relação se dá sob a égide de
uma dimensão do pensar que Heidegger chama “o pensar que calcula”.
O mundo aparece agora como um objeto sobre o qual o pensar
que calcula dirige seus ataques, e a estes nada mais deve resistir.
A  natureza  torna-se  um  único  reservatório  gigante,  uma  fonte
de  energia  para  a  técnica  e  a  indústria  modernas  (Heidegger,
980, p. 4 ).
Segundo Heidegger, o pensar que calcula é indispensável, mas é uma dimen-são do pensamento. Sua especificidade reside no fato de que, quando planificamos
e  organizamos,  lidamos  sempre  com  condições  já  dadas  de  fazê-las  servir  a  algum
objetivo  específico.  O  pensar  que  calcula  computa  sempre,  mesmo  que  não  traba-lhe nem com computadores nem com números; computa novas possibilidades para
chegar a resultados definidos.
O  cálculo,  que  domina  o  modo  de  ser  do  homem  planetário,  não  designa
simplesmente  a  prática  do  saber  matemático,  mas  “um  modo  de  comportamento”
que  determina  todo  tipo  de  ação  e  atitude  desse  homem.  Segundo  Heidegger,  sua
exacerbação  é  a  atitude  que  só  reconhece  como  real  a  ação  prevista,  organizada,
planificada. O cálculo, enquanto tal, se opõe a todo movimento espontâneo daquilo
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que  cresce  a  partir  de  si  mesmo,  daquilo  que  se  move  a  partir  de  seu  crescimento
intrínseco.  Para  ele,  os  avanços  tecnológicos  resultantes  da  exploração  da  energia
atômica  deflagraram  um  movimento  que  se  desenvolve  num  ritmo  sempre  mais
acelerado, que já independe da vontade do homem. A planetarização de uma socie-dade  que  aboliu  fronteiras  espaciais  e  temporais  coloca  um  desafio  para  o  homem
contemporâneo enquanto tal: o desafio de aprender a lidar com o poder da técnica.
Para que isso aconteça, precisa compreender seu sentido.
Heidegger não propõe uma recusa do mundo tecnológico. Seria uma insen-satez, afirma ele, atacar a tecnologia cegamente. Precisamos das invenções técnicas
e  delas  dependemos.  Aquilo  de  que  não  precisamos  e  do  qual  nem  dependemos  é
manter uma relação de tal modo unidimensional com o tecnológico que essa relação
se  torne  uma  servidão.  O  que  podemos  fazer  é  aprender  a  lidar  com  o  poder  que
o mundo tecnológico traz, cuidando sempre para que essa relação seja de indepen-dência. Entretanto, Heidegger alerta para o profundo perigo da situação vivida pelo
homem contemporâneo.
A  onda  que  se  aproxima  da  revolução  tecnológica  poderia  de
tal modo cativar, enfeitiçar, seduzir e absorver o homem, que o
pensamento  que  calcula  viesse  um  dia  a  ser  aceito  e  praticado
como o único modo de pensamento (Heidegger, 980, p. 47).
Se isso acontecesse, o ser humano se alienaria de sua natureza essencial, que
é  a  de  ser  um  ser  que  medita,  ou  seja,  um  ser  que  ausculta  o  sentido  de  tudo  que
existe.  É  esta  via  de  um  pensar  meditante  que “exige  de  nós  que  não  nos  fixemos
sobre um só aspecto das coisas, que não sejamos prisioneiros de uma representação,
que não nos lancemos sobre uma via única numa única direção” (Id., p. 44).
Para  isso,  é  preciso  uma  atitude  de  que  se  dispõe  a ‘deixar-ser’  os  seres  e  as
coisas,  inclusive  os  objetos  tecnológicos.  Podemos  reconhecer  nos  objetos  tecnoló-gicos,  que  fazem  parte  de  nosso  cotidiano,  seu  lugar  de  coisas  que  não  têm  nada
de  absoluto,  e  que  dependem  de  uma  realidade  mais  alta.  Ao  pensar  o  mundo  da
técnica  no  qual  estamos  envolvidos,  Heidegger  convida-nos  à  mesma  atitude  de
desapego e deixar-ser. Podemos dizer sim à utilização dos objetos técnicos e, ainda
assim, manter-nos livres diante deles. Podemos “deixar-ser” estes objetos como algo
que não nos envolve intimamente; dizer ao mesmo tempo “sim” e “não” aos objetos
tecnológicos é não permitir o estabelecimento de uma relação de exclusividade com
eles – que é a relação na qual o homem contemporâneo termina por ser dominado
pelo mundo tecnológico que ele mesmo criou.
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É importante enfatizar que a palavra técnica, para Heidegger, não se limita
aos objetos tecnológicos, mas a toda atitude que se desenvolve no enquadramento
da  racionalidade  unilateral  que  reduz  os  outros  seres  à  condição  de  objetos  cujo
único  valor  reside  em  como  podem  ser  utilizados  pelo  sujeito  humano.  Aquele
que “deixa-ser”  instaura  uma  relação  simples  e  pacífica  com  as  coisas,  ao  mesmo
tempo  em  que  lida  com  elas;  reconhece  que  o  mundo  tecnológico  não  é  o  único
modo segundo o qual as coisas podem ser. O universo não se resume a uma soma
de objetos, conhecidos ou ainda não conhecidos, que estariam a dispor do ser hu-mano.  No  enquadramento  do  mundo  da  técnica,  outros  modos  de  desvelamento
dos seres foram ofuscados, na medida em que o homem projetou a sombra de sua
vontade de poder sobre todas as coisas, vendo-as unicamente como objetos de um
sujeito egocentrado e onipotente.
Este  ofuscamento  corresponde  a  um  empobrecimento  do  próprio  ser  hu-mano,  um  estreitamento  de  suas  potencialidades  de  sensibilidade,  percepção  e
pensamento.  No  pensamento  de  Heidegger,  tal  processo  provém  de  um  esqueci-mento: o esquecimento do sentido do Ser, que é simultaneamente o esquecimento
de nosso verdadeiro ser, de nossa identidade autêntica. No entanto, só esquecemos
aquilo que já soubemos; só perdemos aquilo que já tivemos e que, por isso mesmo,
podemos recordar e restituir. Este re-encontro se dá mediante uma mudança radi-cal em nossa postura de vida; a disposição de “deixar-ser” os outros seres, a renún-cia ao desejo voraz de tudo controlar e possuir. Na medida em que isso acontece,
podemos  reatar  com  a  experiência  que  os  gregos  antigos  chamavam Thaumas,  a
experiência  da  admiração  e  do  espanto  diante  da  presença  do  extraordinário  no
comum e cotidiano.
Heidegger,  ao  tomar  a  ética  no  seu  sentido  grego  de  morada,  revela  sua
dimensão de ambiência, isto é, a ética como modo em que o ser humano realiza
sua  humanidade.  É  neste  sentido  que  Heidegger  se  reporta  à  palavra  do  pen-sador  pré-socrático  Heráclito  de  Éfeso  (séc.  VI  a.C.): “A  morada  do  homem  é
o  extraordinário”.  Uma  das  ressonâncias  que  esta  palavra  de  Heráclito  desperta
é  o  assinalar  o  ser  humano  como  ser  que  está  sempre  aberto  –  quer  ele  o  saiba
ou  não  –  à  possibilidade  de  dar  testemunho  da  eclosão  do  extraordinário  –  a
plenitude do Ser – em sua manifestação nos seres de nosso mundo. O lugar do
ser humano no todo é dar testemunho desta epifania do Ser. Na arte, na poesia,
no  ritual,  e  até  na  tecnologia  fiel  a  sua  significação  originária,  alcançamos  a
nossa  autêntica  humanidade  à  medida  que  nos  dispomos  a  ser  o  que  constitu-tivamente  já  somos  –  o  lugar,  a  abertura  para  a  manifestação  do  Ser  em  todos
os seres. Esta visão sobre o sentido da jornada do humano pode ser encontrada
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em  diversos  momentos  da  obra  de  Heidegger,  entre  os  quais  destacamos  uma
citação do seu texto A caminho do campo, escrito em 949 (com edição em por-tuguês, em 977):
Ele  deixa  o  portão  do  jardim  do  Paço  e  corre  para  Ehnried.
Por  sobre  o  muro  do  jardim,  as  velhas  tílias  o  acompanham
com  o  olhar,  quer,  pela  Páscoa,  ele  brilhe  claro  entre  o  ger-minar  das  semeaduras  e  o  despertar  dos  prados,  quer,  pelo
Natal,  desapareça,  atrás  da  primeira  colina,  entre  flocos  de
nevadas. A partir da cruz, vira em direção à floresta. De pas-sagem pela orla, saúda um alto carvalho, em cuja sombra está
um banco talhado a cru.
Nele  repousava  às  vezes  um  ou  outro  texto  dos  grandes
pensadores,  que  o  desajeito  de  um  novato  tentava  decifrar.
Quando  os  enigmas  se  acumulavam  e  nenhuma  saída  se
apresentava, servia de ajuda o Caminho do Campo. Pois em
silêncio  conduz  os  passos  por  via  sinuosa  através  da  ampli-dão da terra agreste.
Pensando,  de  quando  em  vez,  com  os  mesmos  textos  ou,  em
tentativas  próprias,  o  pensamento,  sempre  de  novo,  anda  na
via  que  o  Caminho  do  Campo  traça  pela  campina.  Ele  per-manece  tão  próximo  dos  passos  de  quem  pensa,  como  do
homem da terra que, nas primeiras horas da manhã, se enca-minha para a ceifa.
[...]
Entrementes, a consistência e o odor da madeira do carvalho
começavam a falar mais perceptivelmente da lentidão e cons-tância com que a árvore cresce. O próprio carvalho afirmava:
só  este  crescer  pode  fundar  o  que  dura  e  frutifica.  Crescer
significa  abrir-se  à  amplidão  dos  ceús  mas  também  deitar
raízes  na  escuridão  da  terra. Tudo  que  é  maduro  só  chega  à
maturidade se o homem for, ao mesmo tempo, ambas as coi-sas: disponível para o apelo do mais alto céu e abrigado pela
proteção  da  terra  que  tudo  sustenta.  É  o  que  o  carvalho  diz
sempre ao Caminho do Campo, que lhe passa ao lado seguro
de sua via (Heidegger, 977, pp.46-47).
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Há  pouco  mais  de  400  anos,  acostumamo-nos  a  pensar  a  identidade  do
homem como a do sujeito em si mesmo fundado, cuja humanidade se realiza na
razão  direta  de  sua  capacidade  de  tudo  controlar.  A  dimensão  de  nosso  pensa-mento, a dinâmica de nosso pensar acompanham esta determinação do homem
com  o  sujeito  em  todas  as  suas  características  de  dicotomização,  unidimensio-nalidade e reificação.
A  radicalidade  da  crise  que  vivemos  nos  põe  diante  da  necessidade  de
questionar  não  somente  os  nossos  conceitos  e  preconceitos,  mas  a  própria  di-mensão na qual pensamos. Para esta tarefa o pensamento de Martin Heidegger
constitui, sem dúvida, uma das mais importantes referências de nosso tempo.
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Referências
HEIDEGGER, M. Sobre o humanismo. [Trad. Emmanuel Carneiro Leão]. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 967.
______. Sobre o problema do ser / O caminho do campo. São Paulo: Duas Cidades,
969.
______. “The origin of the work of art”. In: HOFSTADTER, Albert (org. e trad.)
Heidegger, poetry, language, thought. New York: Harper and Row, 97 .
______. O caminho do campo. [Trad. Emmanuel Carneiro Leão]. Revista de Cul-tura. VOZES, v.LXXI, maio/ 977.
______. Serenité. [Trad. André Préau]. In: HEIDEGGER, M. Questions III et IV.
Paris: Gallimard, 980.
______. O que é isto – a filosofia? e Identidade e Diferença. In: Conferências e escri-tos filosóficos. São Paulo: Nova Cultural, 99 . (Coleção Os Pensadores, 5)
______. Construir, habitar, pensar. In: HEIDEGGER. Ensaios e conferências. Petró-polis: Vozes, 2002

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